Coisas que só nos acontecem a nós nº 17
Vou confessar que já fiquei trancada dentro de casa, não uma mas sim duas vezes.
A primeira de todas foi fácil de resolver. O marido, namorado na altura, trancou a porta da rua e eu quando fui para sair apercebi-me que não tinha chave. Como vivíamos num primeiro andar duma moradia, saltei para o patamar da porta e desci ao quintal. O que me valeu é que os meus padrinhos estavam em casa de folga porque, caso contrário, nunca conseguiria saltar o portão de dois metros. Assim pode sair pelo portão, ir buscar a chave ao carro e voltar a trás para trancar a janela pela qual saltei.
Da segunda vez já não foi assim tão fácil. Cheguei a casa vinda do trabalho e o marido estava de saída para ir jogar à bola. Despedi-me dele e fui tomar banho. Saiu do banho, arranjo-me e vou, toda contente, em direcção da cozinha para comer alguma coisa porque estava cheia de fome. Tento abrir a porta do hall e esta não se mexe. Tento novamente e nada. Enquanto estava a luta para abrir a porta no meu cérebro passavam mil e uma possibilidades para a porta não abrir. Será que a fechadura se estragou? Espreito pela lateral da porta a ver se o trinco mexia e este mexia-se mas reparo que está outra coisa por baixo. Percebo que o marido trancou a porta quando a fechou para o cão não ir atrás dele.
Deixei-me estar, durante uns minutos, a pensar o que fazer. Estava furiosa, estava faminta, o facto de estar faminta deixava-me ainda mais furiosa. Não podia ligar ao marido porque o telemóvel estava do outro lado da porta. Não podia arrombar a porta porque, para além da minha fraca estatura, estava do lado contrário ao da abertura da porta. Eis que me surge a ideia luminosa de passar da varanda do quarto para a janela da cozinha. Vou até à varanda pronta para tentar passar para a janela mas olho lá para o chão tão longe e fico com medo de cair do quarto andar a baixo. Volto para dentro e dou mais uns encontrões na porta à espera que ela se abra magicamente. Decido com toda a convicção que tenho que passar pela varanda e não vale a pena ter medo. Novamente na varanda coloco á perna de fora mas não consigo deixar de pensar o quão estúpido seria a noticia de: "mulher morre a tentar escapar de assoalhada onde estava trancada."
Escusado dizer que voltei para dentro. Fui ao escritório, peguei numa folha de papel, um clip e na chave da porta do mesmo. Meti a folha de papel debaixo da porta, coloquei a chave do lado de dentro e fui forçando a outra a sair, com a ajuda do clip fui direccionando a chave até que esta caiu direitinha em cima da folha. Puxei a folha com todo o cuidado enquanto pedia para que a chave passa-se debaixo da porta e não é que passou.
Abri a porta e a primeira coisa que fiz foi ligar 15 vezes para o marido para lhe azucrinar o juízo, claro que ele a jogar nem ouviu o telefone. De seguida passei revista às portas todas e tirei todas as chaves para que mais ninguém ficasse trancado numa assoalhada