Uma mãe obsessiva, um pai muito stressado e 4 filhotes. O mais velho hiperativo, o segundo com um feitio muito particular e dois bebes gemeos. Tanta cabeça debaixo do mesmo tecto não pode dar coisa boa.
No sábado cheguei a casa tarde. Os gémeos vinham a dormir no carro. Tivemos que os carregar para o andar de cima, despir, vestir. Tudo isto é eles nem abriram os olhos. Eu estava exausta depois de um dia inteiro de festas e mais festas. Arrumei o que podia e fui dormir. Dez, quinze minutos depois estava quase a entrar no sono quando ouvi um Bip.
Não identifiquei o som e pensei que teria sido impressão minha. Um pouco depois outro Bip. E outro um pouco depois.
- Mãe que barulho é este?
- Não faço ideia mas tenta dormir.
Fechei as portas dos quartos para reduzir o som e tentei dormir. Uma da manhã e ainda andava às voltas devido aquele Bip que se ouvia de poucos em poucos minutos. Vi as duas da manhã chegarem e enterrei a cabeça debaixo dos lençóis e cobertore. Acabei por adormecer mas aquele som entra a na minha cabeça e penetrava nos meus sonhos. Às cinco da manhã saí da cama a maldizer o alarme que para mim era o responsável. Tratei de o desligar e o Bip continuava.
- O que andas a fazer? - perguntou o marido
- Desliguei o alarme mas este som não pára.
- Não é o alarme mas sim o detector de incêndios. Deve precisar de pilha.
Nunca tinha percebido que tínhamos tal coisa em casa mas na verdade lá estava o dito aparelho no tecto de casa.
Só de manhã é que o marido subiu ao escadote e calou o dito. Escusado será dizer que não dormi quase nada.
Queixem-se lá, agora, que as crianças acordaram à hora do costume e não vos deixaram dormir mais uma hora?
- Sabe minha linda estou com o cabelo muito seco a minha amiga Anita disse que vocês tem uma máscara capilar que é um mimo.
- Uma mascara capilar?
- Sim. Ela mostrou-me a embalagem. É rosa com umas letras em dourado.
- Já sei qual é. Deixe-me ver se ainda temos.
No armazém:
- Sr. João?
- Sim
- Sei que me disse que temos que despachar as compotas de abobora com amêndoa mas a Dª Constança quer uma mascara capilar.
- E as compotas de abobora são maravilhosas para isso.
- Para o cabelo?
- Sim convence a velha gaiteira que a abobora lhe vai deixar o cabelo num brinco. Vais ver que daqui a dois ou três dias volta a agradecer porque tem o cabelo maravilhoso.
- Mas colocar uma compota peganhenta na cabeça não é muito boa ideia.
- Claro que é rapariga. Sei que só estás connosco à uns dias mas tens que te habituar a vender o que te digo e não o que o cliente quer.
- Peço desculpa sr. João mas não vou fazer tal coisa!
- Como não vais fazer? Tens que fazer o que eu digo.
- Não tenho não senhor. Sabe que mais, eu despeço-me! Não vou trabalhar num local que engana as pessoas.
- Vais te embora? E agora quem é que atende o balcão.
- Você claro. Vá intrujar a senhora. E já agora coma alguma da compota a ver se fica um ser humano mais doce.
Fui buscar os gémeos à escola. Assim que cheguei o Salvador correu para mim. Trazia um sorriso maroto no rosto e os olhos brilhantes.
- Mãe a C tentou beijar-me. - disse com tamanha felicidade no rosto.
Percebeu que aquele segredo saiu mais alto do que deveria ter saído e que a educadora tinha ouvido. Ficou todo envergonhado deu-me a mão e quis logo vir embora.
- Filho eu quero saber melhor essa história.
- Mãe não é nada demais ela também me tentou beijar. - explicou o Santiago
Ontem no vestiário da natação ouvi um comentário. Já não é a primeira vez que oiço algo do género das mais diversas mães.
Os rapazes já tinham ido à aula, estavam de banho tomado a vestir a roupa. Eu tratava de dobrar toalhas, arrumar chinelos, distribuir roupa limpa quando ouvi:
- Estás a ver os meninos? Já se vestem sozinhos. Não são como tu.
Eu olhei para aquela mãe e senti um misto de emoções. Não sei se a criança ficou ou não envergonhada pelo que a mãe apregoava a tão alto som, mas eu fiquei por ele. Odeio estas comparações. Se um já come sozinho o outro também tem que comer. Não concordo, nunca concordei e nunca vou mudar de ideias. Todos nós somos seres diferentes com tempos e ritmos diferentes. Temos que aprender a respeitar isso.
Olhei para aquela mãe e pensei num programa que, em tempos, vi com um psicólogo de renome, o qual disse uma frase que me marcou para sempre. “ As mulheres queixam-se dos homens mas são as mulheres que os educam assim”. Verdade? Para mim sim. Se eu não educar os meus filhos a ajudar em casa como é que o vão fazer quando seguirem as suas vidas.
Já não é a primeira nem a segunda vez que oiço enaltecerem o fato de os meus filhos se saberem vestir sozinhos. No entanto é necessário perceber que não aprenderam sozinhos. Muitas foram as vezes em que desesperei. Vestir uma t-shirt demorava mais de cinco minutos em vez dos dez segundos expectáveis . Muitas foras as vezes que só me apetecia tratar eu do assunto para ser mais rápida. Saí muitíssimas vezes atrasada e stressada. Felizmente o tempo que gastamos na altura deu frutos. Os rapazes ganharam autonomia e isso melhorou a nossa qualidade de vida.
Não critiquei aquela mãe. Nem tão pouco o pretendo fazer com este texto. Escrevo para alertar que muitas vezes as crianças só não fazem as coisas porque não sabem. Em vez de criticarem os pequenos ensinem.
Para mim este ano o verão foi um pouco estranho. Talvez tenha sido do vento que não nos largou e arruinou as noites de calor. Talvez tenha sido só impressão minha. Pensei que o calor se manteria até tarde. Que seria daqueles anos em que iríamos usar t-shirt até Novembro. O Outubro veio e provou que estava bem enganada.
Este fim de semana dei a mão à palmatória e resolvi preparar os roupeiros para as próximas estações.
Felizmente conseguimos reaproveitar imensa coisa. Os gémeos e o Leonardo estão vestidos. O Guilherme precisa de meia dúzia de coisas.
O que não serve já está em sacos para seguir viagem para outras casas com a nossa que acreditam piamente no reutilizar e reciclar.
Ela alternou várias vezes o olhar entre a morada rabiscada, numa folha de papel, e a estrutura que lhe aparecia à frente. O dia em que ele a tinha convidado para viver com ele tinha sido um dos melhores da sua vida. Aceitara prontamente e passara dias em conseguir deixar de sorrir. Passara horas a sonhar com o seu novo lar e com o inicio de uma nova vida. Pedira transferência para uma sucursal da empresa e apanhou o primeiro voo assim que teve uma resposta afirmativa.
Partiu para um pais estrangeiro sem olhar para trás. O amor que sentiam um pelo outro falava mais alto que todos os receios. No aeroporto teve que apanhar um autocarro e depois um táxi até chegar ao destino. O namorado pediu imensas desculpas mas era de todo impossível ir ao encontro dela.
Horas depois de deixar a sua casa olhava para o seu novo lar. Na sua terra aquela estrutura seria apelidada de cabana. Estava velha e muito negligenciada. Por momentos pensou que estaria no sitio errado mas eis que o namorado apareceu à porta.
- Estava a ver que nunca mais chegavas! – exclamou enquanto a tomava os braços
- Pensava que estava enganada.
- Eu sei que não tem muito bom aspeto.- disse quando percebeu o seu receio perante a habitação. – Precisa de obras mas foi a única coisa que consegui arrendar. Não fazes ideia do valor das rendas aqui.
- Não sei se consigo viver aqui.
- Claro que consegues. Encara como uma pequena aventura. Se não conseguires podemos procurar outra coisa, com dois ordenados devemos conseguir algo um pouco melhor. Anda.
Ela deixou que ela a guiasse. O calor da sua mão, o sorriso no seu rosto. Lá dentro verificou que não era péssima. No ar pairava um cheirinho bom de uma refeição que ele tinha preparado para ela. A sala estava cheia de flores. Continuava a ser uma cabana mas estava cheia de amor.